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Perspectiva da ciência cinesiológica e biomecânica nas técnicas de projeções do judô

 

A essência de todos os esportes é a competição de habilidades de movimento e de perícia. A biomecânica do esporte é a ciência dos movimentos do esporte. Em função disso, e nada mais, é vital para a prática desportiva. Durante décadas, os movimentos atléticos foram executados e aperfeiçoados pela instituição dos treinadores e dos atletas. Temos evidências, na literatura, de que alguns médicos compreenderam as leis do movimento antes mesmo que Sir Isaac Newton as descrevesse. Foi relatado que Sancho Pança, quando viu seu famoso

senhor lutando contra moinhos de vento, disse algo sobre a terceira lei de Newton: ele sabia que os moinhos de vento feriram seu senhor tão brutalmente quanto ele o feriria. Embora ainda seja possível encontrar pessoas convencidas de que o conhecimento intuitivo em biomecânica é suficiente para o êxito, essa não é mais a atitude predominante. (Zatsiorsky, V., 2000). O estudo da Cinesiologia e da biomecânica, aplicadas ao Judô ou a qualquer outra modalidade desportiva, caracterizando o movimento humano e aprofundando o conhecimento na análise do movimento, proporcionando reflexões sobre outras perspectivas no espaço educacional em geral, se preocupa com as análises osteomioarticulares, bem como pela análise físicas durante o movimento do corpo humano, levando-se em consideração a técnica de execução do movimento pretendido e até mesmo as características anatômicas do executante. O judô foi, durante muito tempo, um instrumento de educação filosófica, psicológica e física, baseado na cultura oriental, que pretendeu conservar o carácter não violento da sua prática, diferenciando-o das demais formas de luta. É imprescindível o conhecimento dos mecanismos de atuação dessas forças, desenvolvimento de uma quantidade maior de pesquisas na área da biomecânica que promovam melhorias ao nível de treinamento e execução de movimentos, bem como das ações/funções musculares para que se possa

compreender a execução dos movimentos e suas relações com as cargas mecânicas nas quais o aparelho locomotor é submetido a fim de potencializar o rendimento na modalidade. A cinesiologia vem do grego kínesis = movimento + logos = tratado, sendo definida como a ciência que tem como enfoque a análise dos movimentos, ou seja, estuda os movimentos do corpo humano (Dobler, 2003). Já a biomecânica, definida e orientada para a aplicação das leis que fazem parte da órbita da mecânica para a composição e deslocamento de organismos vivos. O termo vem de “biomécanique”, uma palavra francesa. Parte integrante desta ciência, procura medir, modelar, explicar, categorizar e catalogar os padrões de movimento baseando-se na física do movimento humano, conhecida como em biomecânica desportiva (Hamill, J; Knutzen, K.M, 1999). Mais do que simplesmente aplicar as leis da física, a biomecânica leva ainda em consideração as características do aparelho locomotor (Amadio; Serrão, 2007).

O judô é uma arte marcial criada no Japão por Jigoro Kano em 1882 (Kano,2008). Ao longo dos anos disseminou-se no mundo todo. Atualmente o judô é um esporte com muitos praticantes no Brasil, tendo vários atletas de destaque no cenário mundial (CBJ, 1999). Há uma necessidade de uma quantidade maior de pesquisas em biomecânica, que promovam o melhoramento no treinamento dos atletas. Essa escassez de estudos, principalmente observada em academias e clubes, muitas das vezes sem apoio científico-técnico do desporto promovido pela Ligas, Federações e Confederações, e, que também se encontram em deficiências nos órgãos importantes que promovem o judô nacional, se deve ao esporte ser acíclico, acarretando em dificuldades para analisar biomecanicamente em situações reais de luta e pelo apoio político e financeiro.

Walker (1980) Afirma que o judô faz uma apelo a uma compreensão intuitiva das leis da física clássica, sobre o efeito das forças e da interação entre adversários, pela estabilização dos equilíbrios, dos movimentos e das rotações. Sariola (1990), técnico e pesquisador de judô, afirma que a importância da ciência de suporte ao treino dos desportos de elite é indiscutível. A biomecânica ocupa, nesse sentido, um nível destacado, como ajuda ao ensino da técnica desportiva.

Contrariamente à ciência, o judô foi, durante muito tempo, um instrumento de educação filosófica, psicológica e física, baseado na cultura oriental, que pretendeu conservar o caráter não violento da sua prática, diferenciando-o das demais formas de luta.

Os princípios do judô, segundo Kano (2008),se inspiraram em três princípios para idealizar o Judô: Seiryoku-zen-yo, Jita-kyoei e Ju. Seiryoku-zen-yo representa a máxima eficiência com mínimo esforço. Foi criado não apenas para atender às expectativas na parte física abordada nos treinos, mas também na parte espiritual, que caminhe junto com o corpo, para o seu aprimoramento. Jita-kyoei representa o princípio do bem estar e benefícios mútuos em que mostra a importância da solidariedade humana no crescimento individual e universal, pois Kano acreditava que a eficiência e o auxílio ao próximo criariam não só um atleta melhor, como um ser humano mais completo. “Ju” é o princípio da sua verdade em que se prioriza o uso da técnica ou seu uso adequado de força, economizando energia e proporcionando maior eficiência na execução dos golpes. Para Rocha (1967), podem ser considerados como básico quatro princípios aplicados no judô: princípio do equilíbrio e do desequilíbrio; princípio do sistema de alavancas humanas; princípio do máximo contra o mínimo; princípio do momento.

Segundo a literatura, Takeshita(1895) e citado por Nagata (2010) , observa-se a necessidade de constituir mais uma importantes análise complementar referente aos princípios que norteiam a arte da luta Judô: Atacar com segurança e precisão; abastecido de emprego desordenado da força bruta, Pois todas as energias são necessárias no decorrer da luta; basear nos movimentos na agilidade do adversário e tirar-lhe, na medida do possível, o tempo necessário para aplicações de golpes.

As propriedades mecânicas do músculo esquelético determinam o seu desempenho.

Propriedades mecânicas são definidas como aquelas propriedades do músculo esquelético que podem ser medidas ou parâmetros derivados da mecânica: força, comprimento, velocidade, trabalho e potência, segundo Zatsiorsky, (2000). O desempenho alcançado em muitos esportes depende, em grande parte, desses parâmetros, por exemplo, da força que um atleta consegue produzir ou da velocidade e agilidade que consegue alcançar permitindo, a esse atleta resultados favoráveis na modalidade esportiva praticada.

Segundo Hall (2000), citando uma análise biomecânica, descreve que focado no desempenho esportivo, nas suas diversas modalidades, visando à melhora da performance, com aplicação correta dos movimentos, tendo conhecimento da melhor maneira de utilizar-se de mecanismos cinesiológicos e biomecânicos, como a alavanca e centro de gravidade aliadas a força torque, contrações musculares, entre outras propriedades, utilizando-se de métodos de medição como a cinemetria (movimentos osteocinemáticos e artrocinemáticos),aqui deve-se destacar que através desse método estuda-se o melhor aproveitamento dos princípios físicos de eficiência e economia energética, dinamometria, plataforma de força, antropometria, eletromiografia, entre outros métodos conhecidos e eficientes na apuração e análise dos gestos esportivos, especificamente na modalidade judô, as projeções ( nage-waza). Detanico (2007), citado por Nagata (2010), sugere que a fase de projeção de uma técnica no Judô de forma eficaz, no aspecto biomecânico, é relacionada a três fatores: tipo de técnica – koshi-waza, ashi-waza ou tê-waza, estrutura corporal e encadeamento com a fase de desequilíbrio. As técnicas de te-waza são projeções que utiliza o braço como ponto de apoio do sistema de alavancas para elevar e rotacionar no momento de projetar o uke, sendo que, quanto menor o comprimento de membros inferiores do tori, maior eficiência do movimento,

ou seja, quanto mais baixo o centro de gravidade, maior a estabilidade conseguida pelo Judô que executa o golpe. Franchini (2003), citado por Nagata (2010), realizou uma pesquisa em que verificou as técnicas utilizadas no Judô de alto nível, analisando 3950 lutas dos Campeonatos Mundiais e Jogos Olímpicos disputados entre 1995 e 2001, que culminaram com vitória por ippon. Nela

observou que o te-waza (técnicas de braço), ou seja, do Morote Seoi Nage, ou de suas variações, teve um percentual maior dependendo da categoria. No caso, as categorias ligeiro e meio-leve que são as mais leves apresentaram maior percentual de ippon com utilização dessa técnica em relação à categoria pesado. Essa diferença parece ser consequência do fato de atletas com baixo centro de gravidade e maior força relativa, aplicarem melhor essas técnicas. Imamura (2006), citado por Nagata (2010), investigou três diferentes técnicas, técnica de

braço (Morote Seoi Nage, de perna (O Soto Gari) e de quadril (Harai Goshi), analisando em três fases da projeção (kuzushi, tsukuri e kake). Utilizou para isso a cinemetria e concluiu que o arremesso do Morote Seoi Nage foi menos potente do que as outras duas técnicas, que é considerado mais técnico, e é uma técnica mais adequada para atletas de estatura baixa e com boa agilidade fazerem. Já nas outras duas técnicas, o arremesso foi mais potente, que é mais adequado para atletas maiores e mais fortes. Hasegawa et al. (1993), citado por Nagata (2010), investigaram a força de reação no solo do tori na execução do Morote Seoi Nage utilizando uma plataforma de força. A posição do centro de gravidade do corpo no instante de arremesso foi menor para os atletas de maior habilidade. Não houve diferença significativa do sinal da plataforma de força para os atletas de maior e menor estatura. O tempo de aplicação, contudo, foi menor para os mais habilidosos. Os resultados indicaram que o movimento rápido e com o centro de gravidade mais baixo pode ser útil para um arremesso eficaz. Inokihara (1991), citado por Nagata (2010), também estudou a técnica Morote Seoi Nage e concluiu através de análises biomecânicas através dos ângulos dos segmentos corporais, que o fator mais importante no golpe é a relação mútua entre a posição da ponta dos pés e do joelho do tori e a posição do corpo do uke. Blais, Trilles e Lacouture (2007), citado por Nagata (2010), realizaram um estudo com o objetivo de analisar as forças e os momentos de força das principais articulações em três dimensões durante a execução da técnica de projeção Morote Seoi Nage, e determinar a energia despendida durante o movimento. Os sujeitos executaram o golpe em um ergômetro, onde simulam os movimentos de entrada. Utilizaram câmeras e plataforma de força para coleta dos dados. As forças nas articulações, os momentos de força e o gasto energético foram estimados por meio de equações. Observou-se que os membros inferiores gastaram mais energia para executar a técnica quando comparados aos membros superiores. E em relação às fases do golpe, o tsukuri (preparação) foi o que mais consumiu energia. Assim, concluíram que as principais articulações responsáveis pelos momentos gerados pelo movimento foram dos membros inferiores, apesar do golpe ser uma técnica de braço. Assim, podemos entender o corpo humano como um complexo sistema de segmentos articulados em equilíbrio estático ou dinâmico, onde o movimento é ou pode ser produzido por forças internas e externas que, atuando fora do eixo articular, provocam deslocamentos angulares dos segmentos corporais (Franchini, 2001) Por isso, analisando as técnicas de nage -waza, através dos valores quantitativos, pode-se verificar a melhor maneira de executar o golpe com eficácia mecânica e consequente economia energética. Assim, utilizou-se um dos princípios definidos por Jigoro kano, da máxima eficiência o menor esforço. Portanto, é imprescindível o conhecimento dos mecanismos de atuação dessas forças, bem como das ações/funções musculares para que se possa compreender a execução dos movimentos e suas relações com as cargas mecânicas nas quais o aparelho locomotor é submetido a fim de potencializar o rendimento na modalidade. Realça-se o fato da preocupação no mundo do judô da necessidade de uma avaliação e diagnóstico motor com vista a um rigor referencial, promovendo, para os treinadores, modelos que lhe permitem rentabilizar a sua intervenção na gestão e planificação da correção técnica.

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